Vamos começar essa conversa deixando claro o que são os “fringebenefits” que eu menciono no título, assim a gente já adianta a prosa e fica mais fácil para apresentar meus argumentos. Definições são algumas das coisas mais presentes e vastas na rede mundial, o que nos dá a liberdade de escolher a que a gente prefere usar, mas de uma forma mais prática eu posso dizer que no mundo corporativo, no discurso do setor de recursos humanos, “fringebenefits” são vantagens adicionais ou benefícios indiretos associados à remuneração básica negociada com um profissional. Quanto mais alto você estiver na hierarquia, melhores são estes benefícios, e mais comum se torna usar o termo “fringebenefits”, ao invés de simplesmente benefícios.
Não vou entrar na discussão sobre termos em inglês no nosso mundo corporativo, pelo menos não agora. O que importa entender é que à medida que você vai subindo na carreira, esses benefícios associados vão se tornando mais criativos, ricos, interessantes e opressivos.
Uai? Opressivos? Talvez você esteja se perguntando sobre o termo “opressivos” no final da frase, o que por enquanto vai permanecer sendo uma dúvida. Porque começar do começo é sempre uma alternativa mais inteligente, e o começo da frase falava sobre criatividade, riqueza e interesse.
Por muito tempo obedecendo à leis trabalhistas (anacrônicas nos dias de hoje, mas isso também é assunto para outra discussão) as empresas se acostumaram a apresentar os benefícios como algo desimportante na contratação de um profissional, e falar que o sujeito teria vale-transporte, ticket refeição (ou alimentação) e plano de saúde pareciam a parte mais chata do discurso que o RH era obrigado a recitar na contratação do profissional. Pareciam. Repare o tempo verbal.
Isso porque esses benefícios foram se tornando cada vez mais presentes, mesmo para quem está no início de carreira ou na parte baixa da hierarquia. Em um mercado que crescia, que as empresas entendiam que a disputa iria se acirrar e que os profissionais se capacitavam cada vez mais, somente os três benefícios citados antes começaram a soar realmente desimportantes. Oferecer só isso se tornou pouco. E as pessoas vivendo em um país que já não tinha três dígitos de inflação corroendo sua renda entenderam que os benefícios eram a verdadeira diferenciação entre uma proposta e outra. Isso porque o salário seria mais ou menos balizado pelo mercado, mas os benefícios seriam muito diferentes dependendo do perfil da empresa, do arrojo de seus líderes e da capacidade criativa e laboriosa de quem estava no RH.
E aí vimos empresas oferecendo vagas cobertas no estacionamento, participação nos lucros, telefones celulares, convênios em farmácias/academias e até mesmo dias no spa, massagens no turno de trabalho e passeios temáticos para os pais e mães idosos dos profissionais.
Sensacional, certo? Certo, pero no mucho. Porque como qualquer processo de melhoria, mudança e inovação, um certo exagero começou a aparecer e muitas empresas começaram a se apaixonar perdidamente pelos benefícios que ofereciam, se esquecendo de um detalhe valioso e crucial: as pessoas são diferentes.
O que é benefício para uns, interessa pouco ou quase nada para um monte de outros. Mas as empresas “apaixonadas” continuavam oferecendo os mesmos benefícios de forma generalista, criticando todos aqueles rebeldes, inocentes ou estúpidos que não se apaixonavam da mesma forma pelos planos elaborados com tanto entusiasmo.
Me lembro de uma vez que participei de um processo seletivo para Gestor de RH. A empresa era grande, marca respeitada nacionalmente e eu estava no começo do meu casamento. Seria um salto natural, mas impactante na minha carreira e um aumento de renda em começo de casamento é sempre uma situação bacana. Eu fui vencendo as etapas, vendo meus concorrentes minguando em quantidade até que finalmente fui um dos três escolhidos para a entrevista com a diretoria da empresa.
Eu morava, literalmente, do outro lado da cidade. Para ir para a empresa – que era fora de Goiânia, em um outro município próximo – eu teria que atravessar a cidade inteira, o que já me chamava atenção com relação ao tempo despendido e à despesa com combustível. Mas ainda valia a pena. E fui à entrevista empolgado. Os quatro diretores da organização me receberam me disseram sem rodeios que eu era o candidato que eles estavam preferindo até o momento, e eu gostei do jeitão direto, objetivo e sem rodeios ou frescuras daquele povo.
Então perguntei das atribuições do cargo, quais seriam as principais responsabilidades e atividades desse gestor de RH numa empresa daquele tamanho. Fui informado que, como de costume, eu seria responsável pelas atividades de RH (contratação, treinamento, remuneração, avaliação, motivação, demissão, monitoramento… etc e mais oito etcs), pela supervisão do DP (fechamento de folha era a tarefa mais simples da lista), ia cuidar da equipe de segurança e vigilância (sendo gentilmente informado de que meu celular seria o celular de emergências e plantões da segurança), da cozinha, da limpeza, da portaria, da recreação na creche, da equipe da creche, das festas e mais umas oito ou nove coisas.
Uau! Era uma lista de coisas impressionante, mas como eu ainda estava no momento otimista e empolgado, só conseguia pensar no tanto que eu ia aprender e aparecer para o mercado. Me falaram o salário e meu ânimo começou a diminuir, porque era uma remuneração baixa para uma posição de gestão, principalmente para uma posição de gestão que seria responsável pela criação do universo e pelo agenciamento dos quatro cavaleiros do apocalipse (que me ligariam no celular em caso de emergência).
Ainda assim pensei que valia a pena. Era uma melhoria para mim. Não tão grande quando eu imaginava, mas ainda assim uma melhoria. E aí eu fiz a pergunta que destruiu meus sonhos de dominação de metade da população mundial (que seria mais ou menos o tamanho da equipe sob minha responsabilidade): quais os benefícios?
Na época a terminologia “fringebenefits” ainda era nova, e não quis soar arrogante. Relataram uma lista tímida e obrigatória de benefícios. Sem graça mesmo. Perguntei “O que mais?”, ainda tentando encontrar algo que salvasse aquela relação. E eles, entre ufanistas e deslumbrados, me disseram: “se você tiver um bom desempenho e crescer dentro da empresa vai poder se mudar para São Paulo.”
Tomei um gole de água. “São Paulo capital, a grande São Paulo?” perguntei incrédulo. E eles sorriram e concordaram. Agradeci, cumprimentei educadamente cada um deles, lhes expliquei meus motivos e fui embora. Não queria mudar para São Paulo, não quero mudar para São Paulo, não acho que sair de Goiânia – uma capital com ares interioranos e com qualidade de vida – e me mudar para São Paulo – cidade gigante, trânsito, pouca expectativa de qualidade de vida – fosse um prêmio.
E esse erro inocente persiste até hoje em muitas empresas. Cristalizam um pacote de benefícios e se esquecem que oferecer creche só interessa para quem tem filhos. E com isso perdem um monte de profissionais interessantes que poderiam contribuir enormemente com os resultados e o crescimento da organização, simplesmente por oxigenarem e acrescentarem algo de diferente à organização. Perdem excelentes profissionais que, nesse caso, cometeram o erro de não reproduzir-se em filhos.
Eu sou mais do que “fringebenefits”. Eu sou um ser humano com manias, vontades, prazeres e feiúras que tem suas preferências e que adora quando se preocupam em oferecer a mim aquilo que me interessa e me chama atenção.
E você, líder, conhece sua equipe e sabe o que eles querem?
E você, empresárix, conhece seus profissionais e sabe o que querem?
Quer uma dica? Procure saber.
Há braços!
Eduardo Mesquita