Começar texto com definição de dicionário é um dos recursos mais “pobrinhos” que podemos ver em produção de conteúdo, e constantemente somos visitados por esse pecadilho, porque por um tempo isso era um recurso poderoso de estilo. Até hoje enfrentamos essa tentação, e a tentação é grande, mas não é necessária. Como qualquer tentação.
Falar de moda é falar de conjuntos de opiniões, gostos, modos de agir, viver e sentir que são coletivos, e assim como nas maneiras de vestir, nos memes de internet ou nas perguntinhas chatas de facebook, vemos que as modas uniformizam, mas são passageiras. E enquanto passageiras deixam a sensação de que são fúteis e inúteis enquanto vigentes. Mas não é assim.
Modas são revisitadas, recicladas, recriadas e vividas novamente em diferentes pacotes, o que mostra que existem exageros quando as julgamos inúteis ou algo assim. Modas sempre são antecipações de algo que tem grande potencial de experiência coletiva, o que faz com que aqueles que apontam tendências sejam visionários, ousados e atrevidos criadores de novos caminhos. E também faz com que muitos que entram “na onda” sejam vistos como somente criaturas sem rumo que buscam algo que dê retorno rápido ou a sensação de pertencer a algum bando. E modas atraem multidões. Mais ainda, também mostra que os que atravessam a moda, sustentam e consolidam o conceito e sobrevivem ao fim passageiro e volátil do hype sejam criaturas verdadeiramente compromissadas com a ideia.
Sim, poderíamos falar isso das calças boca de sino (hoje chamadas calças flare) ou dos caderninhos de perguntas da quinta série (hoje chamados “Quando você pensa em mim qual a primeira coisa…”), mas aqui estamos falando de modismos administrativos, profissionais e corporativos.
Tivemos grandes movimentos tectônicos que nos trouxeram o empowerment, a qualidade total, os sistemas ISO, o TEAL, a reengenharia, o coaching e, mais recentemente, a mentoria. No momento do êxito orgásmico dos vendilhões dos templos, no auge da grita infinita, é fácil empolgar (de um lado das arquibancadas) ou jogar pedras (do outro lado nas cadeiras numeradas), porém ambos os movimentos são perniciosos, para não dizer perigosos e preguiçosos.
Alguém em sã consciência diria que o empowerment, a qualidade total e os vários ISO são ferramentas inúteis, fúteis e bobas? Provaram-se valiosas ferramentas, geradoras de resultados e de lucratividade, criaram inúmeras equipes redivivas em seus desafios e inovaram numa seara eivada por comportamentos tradicionais e antigos. Mas no momento em que surgiram como grande salvação de todas as lavouras, despertaram desconfiança e criaram montes de desafetos, verdadeiros haters que se divertiam em apontar os bobocas afeitos à nova religião do momento. Assim como fazem hoje com os crossfiteiros e os coaches financeiros.
Lembra que eu disse que mesmo as modas são recicladas? Viu no começo do segundo parágrafo que eu usei a modinha de trazer uma definição do dicionário, mas fiz isso de uma forma reciclada e quase disfarçada? Esse “quase disfarçada” é o comportamento dos que sobrevivem à moda e encontram validade nos conceitos que bombaram nas FM´s populares por algum tempo. Sabedores de que aquela ideia tem valor, sabedores de que aquelas ideias foram exploradas até quase o talo, entendem que não podem simplesmente levantar a bandeira do que foi tão vilipendiado tempos atrás, sob pena de se tornarem tão desacreditados quanto a ideia em si. Mas estamos falando de ideias valiosas, quando aplicadas em conceitos adequados, ambientes certos, pelos processos inteligentes e pessoas envolvidas.
Coaching virou moda. Se chutarmos uma árvore vão cair de lá dois coaches executivos, um life coach e um master coach practioner em PNL. Algum problema nisso? Nenhum. Nenhum se todos estes profissionais apontados se pautassem pela seriedade em seu labor, mas infelizmente no auge da moda vimos coach de criança, pet coach, coach de noiva, coach de separação, coach de reconciliação, coach de solidão e uma infinidade de coachismos diferentes. Sabe o mais interessante e maluco disso? Todos esses temas podem ser verdadeiros alvos da atividade de um coach (tudo bem, crianças eu não concordo, mas o resto…. o resto sim), porque a atividade de coaching se torna muito mais efetiva quando focada, direcionada e obsessivamente apontada para um alvo.
Mas com tanta gente fazendo maluquice com o tema (Coach Quântico? Sério?), logo muitas pessoas se envergonharam de carregar o manto, eu fui um deles como já confessei em um outro texto meu. Não dizia que era coach por vergonha das batatadas cometidas por gente maluca, mas superei isso. Entendo que agora o momento de sandice já passou e estão sobrando os que verdadeiramente acreditam no poder de transformação e suporte que o coaching permite. Não há como acreditar que alguém que venda “Reconfiguração de DNA” possa permanecer muito tempo no mercado. Ou há?
Aos que se envergonham ainda existe a nova moda: mentoria. Muitos surgem se dizendo mentores, mesmo sem barba na cara nem cicatriz pelo corpo (a barba é uma referência de idade, não de gênero, ok?), com pouca experiência de mercado, de vida e de liderança, se arvoram no título de mentores.
É um pecado pior, porque isso sim é bobeira. Mentores de verdade existem, eu os creio, não duvide. Eu sou um deles. Mas não existem nessa quantidade assustadora que os anúncios virtuais nos fazem crer. Mentoria é uma atividade que demanda experiência e muita estrada, uma ou outra falência e cicatrizes, na pele, na alma e no coração. O que acontece é que muitos empolgados que terminam suas 12 horas em seus cursos de “formação” em coaching querem oferecer uma imagem diferente do restante de migrantes do planeta Coach. E aí mudam o nome para “mentores”, sem entender que a atividade é diferente.
Mudar de nome a função é pequeno, porque mesmo se você se chama “Consultor de negócios externos” você vai continuar sendo um vendedor de porta em porta, e qual a vergonha disso? Mesmo se chamando “Setor de Gestão e Retenção de Talentos Humanos”, o setor continua sendo o RH, e qual a vergonha disso?
Fica a pergunta do título: qual será a próxima moda? Porque a moda atual está clara, e nem é uma moda tão nova assim, porque sempre existiu nesses moldes e – pelo visto – sempre vai existir: enfeitar os termos para mudar os conceitos. Assim surgiram pessoas que “estariam ligando”, assim surgiram pessoas que “querem colocar” algo nas reuniões e também pessoas que “a nível de gente, enquanto pessoa” se sentiam mais felizes falando de forma empolada e tumultuada.
Essa moda, pelo visto, é eterna. Como eternos são os pecados.
Há braços!
Eduardo Mesquita